28 abril 2005

Achei que meu pai fosse Deus

Depois da sequência de Nick Hornby arrisquei “Fortaleza Digital” do Dan Brown. Assim que percebi que apesar da radical mudança temática (sai “religião-conspiração” entra “tecnologia-conspiração”) a receitinha é a mesma de “O Código Da Vinci” eu desisti. O cara vai seguir fazendo fortunas e aparecendo na lista de best-sellers da Veja e afins mas, sinceramente, se vc leu um livro do cara já leu todos. Nada contra mas... a vida é curta.

Então emendei “Achei que meu pai fosse Deus – e outras histórias verdadeiras da vida americana”, livro organizado por Paul Auster. O lance é o seguinte: ele foi convidado a contar histórias em um programa de rádio. Tava quase desistindo quando sua mulher, Siri, sugeriu que ele contasse histórias escritas por outras pessoas. Quando Paul percebeu a riqueza do material que estava recebendo resolveu compilar as melhores histórias (organizando por temas) e publicá-las. Só não dá pra entender pq a ‘Cia das Letras’ demorou 4 anos para lançá-lo por aqui.



As histórias são curtas, com 2 ou 3 páginas. E fantásticas! Tô ainda no comecinho mas um preconceito já tombou: há mais vida inteligente nos EUA do que eu imaginava! Hehe...

Os livros do Auster costumam ser amargos e, de certa forma, difíceis. Sou fã da “Triloga de Nova York” e do último, “Noite do Oráculo”. Para os fãs de carteirinha, “Da Mão para a Boca” é obrigatório. Mas eis que o cara se propõe um desafio totalmente novo. (Se alguém conseguir uma versão de áudio do programa dele me avise! Please!!). Desnecessário dizer que se trata d’outro livro de cabeceira obrigatório. Te faz dormir bem.

Como disse que o Auster tava contratado pro Time do BlueNoir, vou surrupiar 2 ou 3 historinhas do livro, que deve ter umas 200 (só para convencê-los a comprar o livro):


A borboleta amarela

Nas filipinas, a tradição era começar os ritos da sagrada comunhão no segundo ano. Todos os sábados, tínhamos de ir à escola para ensaiar como andar, como carregar a vela, onde sentar, como ajoelhar e como esticar a língua para aceitar o corpo de Cristo.

Certo sábado, minha mãe e meu tio foram me buscar depois do ensaio em um Fusca amarelo. Enquanto eu sentava no banco de trás, meu tio tentou dar a partida no carro. O Fusca deu várias engasgadas e então o motor parou. Meu tio ficou em silêncio frustrado e minha mãe se virou para mim e perguntou o que deveríamos fazer. Eu estava com oito anos e, sem hesitar, lhe disse que tínhamos de esperar até que uma borboleta amarela tocasse no carro para que ele voltasse a funcionar. Não sei se minha mãe acreditou ou não no que eu disse. Ela apenas sorriu e se voltou para meu tio a fim de discutir o que fazer. Ele desceu do carro e disse para mamãe que iria até o posto de gasolina mais próximo pedir ajuda. Eu cochilei um pouco, mas estava acordada quando titio voltou. Lembro que trazia um recipiente com gasolina, abasteceu o carro, o carro não pegou, ele fuçou mais um pouco e nada de o carro dar a partida. Minha mãe então desceu e gritou para um táxi. Um táxi amarelo parou. Em vez de nos levar para casa, o taxista examinou nossa situação e sugeriu que meu tio borrifasse m pouco de gasolina no motor. Parece que isso deu certo e, depois de agradecer ao bom samaritano, meu tio girou a chave e o carro pegou de imediato.

Voltei a dormitar. Meia quadra adiante, minha mãe me acordou. Estava toda excitada, e sua voz, cheia de espanto. Quando abri os olhos, voltei-me para onde ela apontava. Voejando em torno do espelho retrovisor havia uma pequenina borboleta amarela.

Simonette Jackson
Canoga Park, Califórnia

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