Em "A Sentinela" (The Sentinel), um conto, ele "inventou" os satélites. Em "2001: Uma Odisséia no Espaço", o livro que foi criado em paralelo com o grande filme de Kubrick, ele inventou HAL - o computador que ainda não conseguimos criar. Destaques de uma obra que tem mais de 70 livros, entre ficção e não ficção. Sir Arthur nos deixou hoje, aos 90 anos.
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Veremos em tudo quanto é canto: "o maior/melhor escritor de ficção-científica". Rótulo fácil e enganador. Esse negócio de "o maior", "o melhor" é coisa de simplificadores. Sir Arthur foi um dos grandes. Meu favorito continua sendo Philip K. Dick. O que não significa que era "o maior".
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Mas é impossível ignorar a obra de Sir Arthur. Para minha despedida, vou destacar só um pequeno detalhe.
Stanley Kubrick, que é para o cinema o que Beethoven é para a música, queria criar um divisor de águas quando resolveu fazer "2001". Até então, filmes de ficção-científica eram todos "B" (ou "C"..."Z"). Discos voadores e monstros intergaláticos eram a matéria prima de simpáticos engraçadinhos, como Ed Wood. Kubrick queria o conhecimento e a imaginação de Sir Arthur.
Sir Arthur sabia que "2001" poderia ser sua obra-prima. Não sei dizer - ninguém saberia - qual foi seu sentimento-motivação quando resolveu revisar e reescrever seu texto no set de filmagens. Gosto de pensar que foi a simples necessidade de ver (e tocar) tudo aquilo que, até então, estava só em sua imaginação.
Dois gênios, trabalhando em conjunto, criando o mesmo mundo e demonstrando-o em diferentes mídias. Torço para que, no mínimo, uma parte desta experiência esteja documentada no recém-lançado DVD especial de "2001". Para quem gosta de estudar *criatividade*, este evento é quase único em nossa história.
HAL, que ainda não nasceu, acaba de perder seu segundo pai. Em março de 2108 (ou 2099), quem sabe, ele estará organizando uma bela festa para Clarke e Kubrick. Não será só pós-IBM (como provoca seu nome), mas também pós-MS, pós-Apple... pós-todos que perderam a oportunidade de criar um computador mais humano. O computador que Sir Arthur imaginou.
19 março 2008
Sir Arthur C. Clarke [1917-2008]
02 outubro 2007
Blade Runner: Enfim!
Lá no início do BlueNoir eu planejei uma série de 100 posts sobre Blade Runner. Parei no segundo. Não porque seria "nerd"emais, mas desanimei quando li que a chance do lançamento de um versão definitiva do filme era mínima. Qual não foi minha surpresa quando, tropeçando (literalmente), descobri via Wired que finalmente será lançado "Blade Runner - The Final Cut".Ridley Scott finalmente conseguiu finalizar sua obra prima. 25 anos depois. E em altíssimo estilo. O filme será relançado nos cinemas, agora em outubro (lá nos EUA). Em dezembro sai a caixa com 5 (!!!!!) DVD's. Todas as versões estarão lá, inclusive a remendada versão original (de 1982). Terá também o "Director's Cut" de 1992. Céus... custará o olho da cara. Mas meu presente de final de ano já está escolhido.
Ridley é um arquiteto chato e perfeccionista. A entrevista que ele deu para a Wired é meio chatinha (e tem 5 páginas). Mas tem revelações maravilhosas. Exemplo? Ridley nunca leu "Do the Androids Dream of Electric Sheep?", do PKD (Philip K. Dick). Fala que na página 32 já existem 17 "histórias". Que o livro seria uma péssima influência para o livro... Pode?
Agora tomei coragem para retomar meu projeto de 100 comentários. Antes (da caixa), acho que vou reler "Do the Androids..." (versão pocket). Aguardem posts doidões...
Marcadores: bladerunner, cinema, pkd, sci-fi
03 setembro 2007
Cegueiras
Se podes ver, repara."
É oficial. O Fernando Meirelles, um dos diretores de "Cidade de Deus", está realmente filmando o "Ensaio sobre a Cegueira", de José Saramago. Salvo engano, é o primeiro Saramago a encarar a telona. Meirelles abriu um blog para documentar o projeto.
Reparou o último link? Blindness... por razõe$ bem conhecida$, o filme será em inglês. Diretor brazuca, trampando com livro publicado originalmente me português... e o filme em inglês. Fico meio triste, mas isso não vai detonar minha vontade de ver a obra. Os atores escalados são muito bons: Gael García Bernal, Juliane Moore, Mark Ruffalo e Danny Glover (!) já estão confirmados. Tirando o Glover (quem não se lembra, é o parceiro do Mel Gibson em Máquina Mortífera), todos os outros são meio "especialistas" em filmes difíceis. Juliane fez "Magnólia". Gael é o favorito dos diretores latinos ("Diários de Motocicleta", "Amores Brutos", "Babel"...). Mark fez o filme pesadão da Meg Ryan ("In the Cut"?) e virou coadjuvante de luxo em blockbusters como "Colateral". Pesadão...
"Ensaio sobre a Cegueira" é um dos livros mais "pesados" que já li. História forte, bem amarrada, que no estilo Saramago de escrever nos deixa sem ar. Talvez este seja o grande desafio do Meirelles, que já confessa no blog seu "frio na barriga". O livro tem um ritmo crescente e constante. Quem acha que é fácil esse tipo de transposição, basta ver a porcaria que fizeram com o "Código Da Vinci". Mas não tem nada a ver... o "Ensaio..." não tem ação. Não do tipo 'popular'. Mas é carregado de tensão. Imagina.. de repente, fica todo mundo cego. Você só precisa saber disso.
Lógico, se fosse você eu trataria de ler logo o livro.
Marcadores: cinema, fernandomeirelles, literatura, saramago
07 agosto 2007
Cinema Cabeça
Com poucas horas de diferença deixaram a vida terrena dois "gênios" do cinema: Bergman e Antonioni. Até o último domingo tentei ler tudo que publicaram sobre os dois. Do "Mais" da Folha até o Agamenon do Globo. Dois extremos e um denominador comum: o papo-cabeça, também conhecido como "espanta mortais normais".
Há muito tempo, no tempo da locadora "7ª Arte" lá pelos lados da rodoviária, eu vi algumas coisas do Bergman. Não me pegou. Mas também não espantou. Só questão de gosto mesmo. Por exemplo, aprendi por vias tortas que dá pra discutir temas semelhantes vendo uma certa safra do Woody Allen. Woody seria um Bergman para preguiçosos... hehe. Perdão: é tão falso quanto conhecer um livro pelo filme. Você deprecia o original. No próximo inverno, se as locadoras de Varginha deixarem, eu prometo que assisto uns 3 Bergman. Fila: Sétimo Selo, Morangos Silvestres e Fanny & Alexander. Só o último, de 82, eu já vi. Mas não tenho condições de apreciar.
Já de uma parte da obra do Antonioni eu posso falar. A parte que eu chamo de Trilogia do Ácido. Trilogias estão na moda, não? Então, Antonioni fez, entre 66 e 75, uma Trilogia. Sem querer. Tanto que ela não tem rótulo. Alguns podem falar em trilogia do "still haven't found what i'm looking for" (ou trilogia da busca infrutífera). Outros vão falar da trilogia "terra estranha". Estranho numa terra estranha é nome d'outro clássico. Mas também combina com essa safra do Michelangelo.Saca só o início: Adaptação de um conto argentino (Cortazar), situando-o na Swinging London - a Londres festiva de 1966. O diretor, reparem, é italiano da gema - de Ferrara. Beatles já era Beatles. Stones era droga pura, ou seja, Stones. Mas, para a trilha sonora, Michelangelo convocou um pianista estadunidense: Herbie Hancock, na flor da idade e da criatividade. Herbie sabia o que tava acontecendo em Londres? Lhufas... Para decorar o cenário Antonioni convocou uma bandinha cult, os Yardbirds. Tem Jeff Beck (despedaçando uma guitarra) e Jimmy Page com cara de carrocho que caiu da mudança. "Blow Up" é pop puro! É cultura global antes da invenção da globalização. E é uma busca.
Colaram um papo cabeça na tal da busca. Muitos se chateiam porque "o filme não tem fim". Parece que todo filme-cabeça não tem fim. E fim, para todos letrados em folhetins globais, é item obrigatório! Como aceitar então um filme sem pé nem cabeça? Preconceito... preguiça. Você encontra tudo que busca? E se a apreciação da busca for tudo o que interessa? Mas não vou chateá-los com questões "cabeça".Liberto da Itália de Visconti e Fellini (hahaha), Antonioni pulou de Londres direto para o vale da morte nos Estados Unidos. "Zabriskie Point" fala (sem dizer) da contra-cultura no novo mundo. Os EUA explodiam com seus hippies, panteras negras, vietnans e tantans. Antonioni colocou Morrison, Janis ou Hendrix na trilha? Não. Na mesma contramão que levou Herbie para o Reino Unido, trouxe Pink Floyd para terras apaches. Outra busca, agora não tão solitária. Outra busca sem fim.
A Bota que atrai é a mesma que chuta. Michelangelo então cai na África e na Espanha. Leva na mochila uma mega-estrela californiana, Jack Nicholson. Joga-o não só numa busca, mas também em um esconderijo. Outra pessoa. Outra vida. Surrupiada d'um defunto. Aqui a trilha é o silêncio. E um tiro. Aqui Michelangelo fecha uma trilogia não programada - que só existe na cabeça d'uns loucos (como este que vos escreve). Aqui (no Brasil), a obra deixou de ser "The Passenger" para virar "Profissão: Repórter". Não é por acaso que o Kubrick, outro saudoso, cuidava inclusive da tradução dos títulos de suas obras. Nevermind... O Passageiro passou... em 75.
Qual foi a pergunta mais comum dos passageiros (repórteres) tupiniquins? O "cinema cabeça" morreu com a morte de Bergman e Antonioni? Hehe... Rio chorando. Quem rotula morre de medo que os rótulos morram. A segunda pergunta? Quem os substitui hoje? Hehe... busca de sobrevida para rótulos. Quem faz esse tipo de pergunta deveria se perguntar: sou substituível? Para quem?
A gente passa. Algumas idéias e obras ficam. As de Antonioni e Bergman estão aí... e ficarão por tempo indeterminado. Curta-as. Não esquenta com o papo cabeça.
03 março 2007
Prêmio de Consolação
Prêmios e campeonatos sempre serão uma fonte de injustiças. Variáveis e gostos são amplos e diversos demais para que a gente simplesmente fale: é o melhor filme, a melhor música, etc. Vivo cometendo tal pecado. "Blade Runner" me ensinou o que é cinemão. Na lata, ele sempre é meu filme favorito. Uma certeza que é constantemente abalada. Quando revi a trilogia do "Poderoso Chefão" pela enésima vez eu cravei: "Poderoso Chefão" é o melhor filme de todos os tempos! Besteira...
Mas uma besteira gostosa. Por isso Nick Hornby, principalmente o seu "Alta Fidelidade", é tão divertido. O protagonista vive fazendo listas: "as 10 melhores músicas para uma segunda-feira modorrenta"; "as 10 melhores músicas quando se está numa fossa daquelas"; "os melhores filmes para um primeiro encontro com uma garota". Não é nada sério. Provoca produtivas e úteis discussões sobre cultura inútil. E grana só entra na história se rolar alguma aposta besta. Caso contrário, é a prosa pela prosa.
Daí que o Oscar e similare$ são uma bullshitagem ('cagada de touro' em pt-br vira besteira mesmo) pura. Uma bobeirinha que movimenta milhões e mobiliza praticamente toda a indústria de entretenimento. Toda mesmo: do mundo da música até o universo dos games. É o principal item em todo o arsenal de marketing de Hollywood. Chega a ser até divertido quando não exagera nas encenações.
Em 1992, quando "Silêncio dos Inocentes" papou todos os prêmios relevantes (filme, diretor, atriz, ator e roteiro), pensei que o Oscar estava ficando mais coerente e livre. Pena, foi uma exceção. Um desvio que só se repetiu no ano passado, quando "Crash" levou o prêmio de melhor filme. Fora isso, a regra no Oscar é grana, conservadorismo e décadas de atraso.
O atraso, maior fonte de injustiças, ganhou um tipo de 'band-aid': aquele tal 'Prêmio pelo Conjunto da Obra'. Hitchcock, o mais completo diretor de cinema, ganhou um. Foi uma das cenas mais deprimentes na história do cinema: Hitch velhinho, muito debilitado. Ele não precisava disso. Assim como Robert Altman. Engraçado é que parece que os caras da academia adivinham quando o cara está prestes a deixar este mundo. Dá o prêmio de consolação e o cara capota. Engraçado nada - é triste mesmo.Mas eis que a Academia resolve inovar: recompensa uma injustiça dando um prêmio 'de verdade'. Assim, finalmente, Martin Luciano Scorsese ganha o prêmio de melhor diretor. Foi quase tão deprimente quanto as cenas com Hitch e Altman. Sorte deles, da Academia, que Scorsese tem um senso de humor danado. E recebeu o prêmio das mãos de três reis magos: Coppola, Spielberg e Lucas. Pegou a estatueta perguntando: "Vocês têm certeza de que sou eu mesmo?" Era.
Não pelo pesado e cínico "Taxi Driver". Nem pela sua obra-prima, "O Touro Indomável". "Os Bons Companheiros" ou "A Última Tentação de Cristo"? Nem pensar. "Os Infiltrados" nem foi um esforço explícito para obtenção do Oscar. É um remake de um filme de Hong Kong!?! Não me lembro do Oscar descer tanto o nível. Talvez o Oscar 2007 seja lembrado pela maior forçação de barra de todos os tempos. Triste.
Tomara que em 2027 eles não estejam fazendo o mesmo com o Alejandro Gonzáles Iñárritu. "Amores Perros" já merecia o prêmio de melhor filme estrangeiro em 2001. "21 Gramas" e "Babel" encerram uma das trilogias mais acachapantes da história do cinema. Mas a academia estava ocupada, corrigindo uma injustiça cometida em 1977.
08 janeiro 2007
Pattern Recognition - The Movie
O livro do William Gibson, que por aqui se chama "Reconhecimento de Padrões", finalmente vai virar um filme. Deve sair em 2008, com direção do excelente e sumido Peter Weir (A Testemunha, Sociedade dos Poetas Mortos, Sem Medo de Viver). Já é uma das grandes notícias de 2007 e 2008, hehe.
[A outra é o possivel lançamento de "Spook Country", novo livro do Gibson, em agosto deste ano. É o primeiro desde "Reconhecimento...". E ele tá sumido de seu blog desde janeiro do ano passado].
Seguinte, sou fanático pelo livro (Nani! kd ele?). Li em 2005 e fiquei torcendo pela inevitável versão cinematográfica*. Na época pensei no Ridley Scott (Blade Runner) para a direção. Mas, pensando bem, o Weir é uma escolha mais certa. Ele não é over em cenografia e efeitos: é um puro Diretor de Atores. Joga as interpretações na frente de tudo. Vide Harrison Ford em "A Testemunha" ou aquela arrepiante atuação de Jeff Bridges em "Sem medo de Viver".
Weir + Gibson... aposto que terá U2 na trilha. Ele tem uma cena memorável em "Sem medo..." com um dos sons mais memoráveis do U2, "Where the Streets have no name". E o Gibson é fanzaço dos caras e vice-versa. Aliás, a história de "Reconhecimento de Padrões" tem um 'q' do U2 de "Achtung Baby" e "Zooropa". A história rola boa parte nas Zooropa, mas faz referências ao 11/set direto.
O que mais escrever sem estragar a história? Hã... a atriz! Quem fará o papel da protagonista, a Cayce. Ela é uma mistura da Nani com a Ariela Mazé (paulistana, nada a ver com a filha do Fábio Jr.). Referências que só eu costuro, hehe. Eu não colocaria uma bonitona+gostosona não. Os estúdios devem ficar tentados a colocar uma Jolie ou Julia (Roberts) no papel. A primeira é muito 'quadrada' (! - não era, ficou) para o papel. E a Julia tá velha (para o papel). Sei lá. Se pudesse ser brasileira seria alguém como a Camila Morgado. Gwyneth Paltrow! É, podia ser. Faz tempo que ela tá devendo um filme bom.
* Agora vou contar um cadinho da história. Não leia se você não leu o livro, ok? Aliás, se não leu, vc tem até 2008 para fazê-lo. Não precisa gostar de sci-fi e afins.
A vocação 'cinematográfica' dos textos do Gibson é notória. A diferença de "Reconhecimento de Padrões" é que tem cinema na história: Um filme maluco que é distribuído em pequenos trechos (menores que a duração média dos vídeos do YouTube) e vira uma mania mundial. Ninguém sabe onde ou por quem o filme é produzido. Aliás, ninguém entende a história. A "febre" faz com que alguns fãs banquem até a divulgação quando um novo trecho "cai na rede".
Imagina só o que um BOM diretor faz com um roteiro assim. Ele fará dois filmes em um! Pode exercitar dois estilos totalmente diferentes. Imagina que briga de foice não foi pra ganhar a direção d'algo assim! Daí que tenho quase certeza que Gibson influenciou na escolha. É fácil pegar um roteiro do Gibson e fazer pirotecnia. Nas mãos do Weir, "Pattern Recognition" deve virar um exercício de estilo como há muito não vemos no cinema.
Caramba... 2008 tá longe!
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Tira-gosto (Scratch) de um trecho de seu livro que serve de base para este artigo:
"Of course," he says, "we have no idea, now, of who or what the inhabitants of our future might be. In that sense, we have no future. Not in the sense that our grandparents had a future, or thought they did. Fully imagined cultural futures were the luxury of another day, one in which 'now' was of some greater duration. For us, of course, things can change so abruptly, so violently, so profoundly, that futures like our grandparents' have insufficient 'now' to stand on. We have no future because our present is too volatile. ... We have only risk management. The spinning of the given moment's scenarios. Pattern recognition." (page 57)
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