Por Luciano Pires
Vivemos recentemente uma experiência que pode nos ensinar muito sobre a convivência com pessoas de idéias antagônicas.Durante as semanas em que nos envolvemos no referendo do “sim” ou “não”, foi interessante ver o volume de informação que circulou pela Internet com argumentos pró e contra o desarmamento. Não me lembro de ter visto um assunto tão debatido. Foi tanta coisa circulando que perdi a credibilidade em qualquer dado que passei a receber. A Internet tem esse problema: aceita qualquer coisa. Textos com assinaturas falsas, resultados de pesquisas manipulados, dados inventados, são coisas normais. Mas o mais interessante foi a situação criada quando meu colega ali ao lado revelou-se defensor do “sim”, enquanto eu optara pelo “não”. As conversas invariavelmente giravam em torno do convencimento, de parte a parte, de que sua posição era a correta. E mais de uma vez a conversa virou discussão.
Que interessante. Temos quase a mesma idade. Somos da mesma classe social. Trabalhamos no mesmo ramo. Somos pais de adolescentes. Somos honestos e éticos. Não temos armas em casa. Mas ele era sim e eu era não. Essa diferença de opiniões fez com que ele mudasse? Tomar uma cerveja com ele ficou diferente? Trocar idéias não é mais como antes? Nada disso. Não mudamos um milímetro. Somos os mesmos. Mas a evolução dos
bate-bocas em torno do referendo rotulou os do “não” como “a turma do mal”. E “os do sim” como a “turma do bem”, naquela atitude maniqueísta tão característica do brasileiro.
Pois faltou pouco para que eu passasse a ser visto como um comedor de criancinhas, um indivíduo maléfico, pronto a agredir qualquer um que encostasse no meu carro. Indigno de ser convidado para uma cerveja...
Por outro lado, os do “sim” foram caracterizados como bobalhões, românticos inocentes úteis que mudariam de lado no primeiro ato de violência armada que sofressem.
Já escrevi a respeito da dificuldade que temos de separar a opinião do indivíduo, do indivíduo. Por pensar diferente passo a ser tratado como um extraterrestre, um demônio vivendo para sacanear as pessoas, apoiado em valores morais errados. Deixo de ser um igual...
Pois saiba que, guardando as proporções, é esse sentimento que faz aquele idiota da torcida organizada matar o torcedor do time adversário. Afinal, ele é diferente. Foi esse sentimento que exterminou judeus nos campos de concentração. O sentimento de que os iguais não são tão iguais. E começa assim: pensam diferente. São “esquisitos”. Uma ameaça. Talvez eu deva me proteger deles... Percebeu?
Idéias são os bens mais fantásticos para se compartilhar. Devemos ter - e defender com unhas e dentes a liberdade de ter - acesso a todas as idéias. Estudar, debater, comparar, criticar, adotar ou recusar idéias é mais que um direito. É uma necessidade. Mas que serve pra nada, se não respeitarmos quem tem idéias diferentes
das nossas.
18 novembro 2005
Penso Diferente
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