30 março 2008

[1003] Morphine | Cure for Pain (1993)

Outra inexplicável omissão de "1001 Discos para ouvir antes de morrer" é o Morphine. Banda estadunidense de Massachusetts, foi uma das mais originais do início dos anos 90. Pois é, do mesmo período "grunge". Críticos e mídia só tinham olhos e orelhas para o que saía de Seattle. Até surgir o Morphine, a mais independente das bandas independentes do final do século passado.

O Morphine é um power trio que guarda poucas semelhanças com os clássicos trios (Hendrix Experience, Cream, ...). Se aqueles giravam em torno do guitarrista, o Morphine simplesmente dispensou o mais básico dos instrumentos rock. Dana Colley (sax) e Jerome Deupree (bateria) amparam o trampo de Mark Sandman (baixo e voz, algumas guitarrinhas, violões e teclados), líder e principal compositor. Detalhe: na maioria dos sons e shows, Sandman toca um baixo que tem só duas cordas.

O primeiro disco dos caras, "Good" (92), já mostra a originalidade da banda. Um mix único de rock, blues e jazz, sem nenhum tipo de sofisticação. Soa cru, direto, áspero. Mas tem momentos muito sutis, como "You Look Like Rain", que poderia pintar em qualquer disco do início de carreira do Tom Waits. Aliás, como este, Sandman é um beatnik tardio.

Mas é "Cure For Pain" (93) que consolida a proposta da banda. Mais rico que o anterior, flerta também com o folk na belíssima "In Spite of Me". O mandolin (contribuição de Jimmy Ryan) lembra um pouquinho "Going to California", do LedZep. A voz sussurrada de Sandman nesta música prova sua versatilidade.

"Dawna", um triste solo de sax, abre o disco. Prólogo contra-mão para o swing de "Buena", que é construído com um impressionante riff de baixo. Dana só aparece no refrão, solando em cima (ou atrás) da voz seca de Sandman. "All Wrong" mostra o trio curtindo o mesmo riff. Nela percebemos claramente a riqueza da bateria de Deupree, nada convencional. Ao contrário do que diz a Wikipedia (destino de todos os links deste post), Deupree só é substituído por Bill Conway em 3 faixas deste disco.

Sandman é cheio de músicas-dedicatórias. No disco anterior já tinham pintado "Claire" e "Lisa". Agora ele fala para "Sheila", "Mary (won't you call my name?)" e "Candy". Suas letras são bêbadas...

Candy said she's made arrangements for me in the sand
And Candy said she wants me with her down in Candyland
... e viajandonas ("A Head with Wings"):
Now I'm floating around up here way above the clouds
So high about the ground
And the only thing that holds my head to the ground
Is this one little skinny string
I got a head with wings
A head with wings
E em "Cure for Pain", nona música do disco, ele vai direto ao ponto:
Someday there'll be a cure for pain
That's the day I throw my drugs away
When they find a cure for pain
A última música é instrumental, um sincero "Miles Davis' Funeral".

Seis anos e 3 discos depois, em julho de 99, Sandman passaria desta para uma melhor. Se foi sem experimentar ou testemunhar a cura. Teve um ataque cardíaco fulminante no palco, logo no início de um show. Deixou uma obra que mostra a falta de regras e fronteiras do mundo do rock. "Cure for Pain" é um bom ponto de partida para conhecer um pouco dessa cabeça com asas.

20 março 2008

[1002] Paralamas do Sucesso | Severino (1994)

Pois é, o Paralamas é uma das ausências mais sentidas em "1001 Discos...". Se acharam espaço até para Carlinhos Brown, claro que cabia pelo menos 1 disco do trio fundado em Brasília no início dos anos 80. De todas as bandas do ápice do rock tupiniquim, o Paralamas foi a única a romper fronteiras de uma maneira mais notável. Tocou em Montreaux em 1987, faz sucesso na Argentina e angariou fãs na Europa. Nada parecido com os feitos do Sepultura, mas o Sepultura não é daquela turma (Legião, Titãs, Barão...)

Mas, qual disco do Paralamas deveria aparecer na seleção de discos que deveríamos ouvir antes de morrer? "Bora Bora" (1988) é divertido e tem "Quase Um Segundo". "Selvagem" (1986) marcou o início do fim da fase 'chicletinho-pop'. "Big Bang" (89) é pesado e com um instrumental riquíssimo. Bom, optei por "Severino", o maior fracasso de vendas da história da banda. Vendeu mais na Argentina do que por aqui.

Lançado depois do adocicado "Os Grãos" (91), "Severino" propõe um caminho totalmente diferente na carreira de Herbert (gtr e voz), Bi (baixo) e Barone (batera). Mais experimental, mais pesado (no som e nas letras), o disco causou estranheza em todos os fãs tradicionais. Só com o tempo e o lançamento do disco ao vivo "Vamo Batê Lata" (95) é que o pessoal começou a se acostumar com algumas músicas, principalmente "Rio Severino", "Vamo Batê Lata" e "Dos Margaritas". Não imaginam o que perdem por não ouvir as versões originais.

O disco abre com "Não me Estrague o Dia", poema curto mais falado do que cantado. O diálogo do milionário com o proletário. Apela, mas funciona. "Navegar Impreciso", que conta com participações de Tom Zé e Linton Kwesi Johnson, é uma pérola declamada. Anti-homenagem aos portugueses que na época, como os espanhóis agora, expulsavam brasileiros de suas terras. "Varal" segue na linha experimental, disfarçando a porrada que vem na seqüência: "Réquiem do Pequeno":

te falta o gesto largo, a ébria poesia
TE SOBRA A PEQUENEZA, AS PEQUENAS CERTEZAS
"El Vampiro Bajo del Sol" é puro Queen. Não por acaso, conta com a guitarra solo do próprio Brian May. Cortesia de Phil Manzanera, ex-guitarrista do Roxy Music, que produziu o disco. Sim, o disco foi produzido na Inglaterra.

Jogando vacas do décimo andar, Herbert se embriaga com "Dos Margaritas", para depois se afogar no melhor (único?) épico que já compôs: "Rio Severino". Esta música já havia aparecido em seu primeiro disco solo, "Ê Batumaré" (92), mas é a versão de "Severino" a definitiva. Seca como o chão do sertão:
és tu brasil, ó pátria amada, idolatrada por quem tem
ACESSO FÁCIL A TODOS OS TEUS BENS
A versão original do disco se encerra com uma das mais bonitas baladas já compostas por Herbert, "O Amor Dorme", um som-homenagem ao filme "The Hunger" (Fome de Viver), de Tony Scott. A versão em CD tem duas faixas bônus, "Go Back" (dos Titãs) e "Casi un Segundo", versão em espanhol sobre um teclado de Egberto Gismonti. A capa e todo o trabalho gráfico do disco, espantoso-bonito-e triste, é de Gringo Cardia, usando como matéria-prima o trabalho de Arthur Bispo do Rosário.

"Severino" não é nada menos que obrigatório.

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Pra quem pegou o bonde andando, entenda esta série.

19 março 2008

Antes de Morrer

Tem uns 40 dias que ameaço iniciar esta série. Desde quando terminei a louca tarefa de ler as 950 páginas de "1001 Discos para Ouvir antes de Morrer". Minha motivação? Claro, reparar terríveis omissões daquela obra. Chato que se preza lê cada uma das 1001 críticas e prepara seu próprio conjunto de críticas, hehe...

Primeira crítica: capa bem nada a ver, né? Tudo bem, a obra trata, principalmente, do universo "rock (pop)". Mas precisava ter um punk na capa? Garanto que espantou muita gente. Repare abaixo que a edição original (em inglês) mereceu uma capa bem mais agradável. Mas, vamos lá...

A compilação é ambiciosa. E envolveu 90 críticos. Com tantas cabeças envolvidas, era de se esperar uma obra meio desigual. Não é o caso. Primeiro porque o trabalho do editor, Robert Dimery, foi muito bem feito. Só em um caso ou outro você repara a persona de determinado crítico - quando ele se exalta. O problema maior é uma certa "uniformidade" de gostos. Queria muito entender porque todo crítico musical dos últimos 30 anos parece saído da mesma chocadeira. TODOS têm uma visão muito parcial do mundo pós 1977 - ou seja, adoram punks, new-waves, papo-cabeça-weirdo, ondas passageiras (que eles desejavam eternas, mas não bancam a longevidade porque se apaixonam por outras modas)... Sim, é exatamente o mesmo perfil de quem escreve sobre música para as revistas da Abril, por exemplo.

São irritantemente freqüentes aquelas críticas que dizem que tal disco é "incômodo", "barulhento", "incompreensível", "desconfortável"... Entendeu o "weirdo" acima? Então... hehe

Mas neste "prólogo" eu só quero apresentar o livro. Nos capítulos seguintes apresentarei os nobres ausentes, não na ordem cronológica do livro, mas tentando respeitar o mesmo padrão utilizado: breve crítica, ficha técnica, informações sobre vendagem etc.

Dos 1001 discos, eu não conhecia uns 30%. De artistas que eu nunca tinha ouvido falar, só uns 15% - boa parte de gente da Ásia ou África. Ou seja, bem distante do meu mundo musical mesmo.

Devo ao livro duas descobertas que, inexplicavelmente, ficaram totalmente fora do meu radar quando mergulhei na Junkyage* (pesquisa que fiz sobre os sons dos anos 30-70). Estou falando de John Martyn e Nick Drake. Dois ingleses que desenvolveram um trabalho muito, muito original, no início dos anos 70. Ambos misturam rock, folk, blues e jazz numa salada muito agradável. Compositores de mão (cabeça) cheia e cantores com uma peculiar voz grave. Nada de Joe Cocker ou Rod Stewart - um grave não agressivo, nada arranhado, se é que me entendem. Para compreender melhor, tentem "Pink Moon" (álbum homônimo, de 1972) de Drake e "Don't Want to Know" ("Solid Air", 1973) de Martyn. Esta última caberia fácil num disco do... Jack Johnson!?! Pois é... escrevi isso. Perdão John.

O livro é separado por décadas, começando nos anos 50. O primeiro disco é "In The Wee Small Hours", de Frank Sinatra. Atual, termina com "The Good, The Bad & the Queen", lançado em 2007 pela banda de Damon Albarn (o cara do Blur e Gorillaz) que tem o mesmo nome. Do jazz ao blacktrashmetal, passando por samba, rumba, tango, jazz africano e pop francês, o livro é bem eclético. Mas algumas inserções parecem mais uma forçada de barra, a necessidade de mostrar que o mundo da música não está restrito ao hemisfério norte, no espaço entre Londres e Los Angeles.

O que desvaloriza um pouco o livro (que é barato, cerca de R$ 60 por quase mil páginas impressas em papel de excelente qualidade), como eu disse lá em cima, é a quedinha dos críticos por modinhas (que não são de viola). Nada, nada justifica que David Bowie e Elvis Costello tenham, cada um, mais de 5 discos listados. Um absurdo. Daí, claro, parte a inevitável queda por tudo que tenha saído da NY pós-Velvet e da Londres pós-Bollocks. Seguindo no ritmo moda-modinha, a partir da metade dos anos 80 aparece um número imenso de discos de rap, hip-hop e afins. Não que alguns destes trabalhos não mereçam destaque. Um livro com essa proposta deve ser democrático. Mas o espaço ocupado por algumas tendências é desproporcional.

Só conseguirei provar minha impressão mostrando tudo o que ficou de fora. Começo o trampo no próximo capítulo. Inté!

Sir Arthur C. Clarke [1917-2008]



Em "A Sentinela" (The Sentinel), um conto, ele "inventou" os satélites. Em "2001: Uma Odisséia no Espaço", o livro que foi criado em paralelo com o grande filme de Kubrick, ele inventou HAL - o computador que ainda não conseguimos criar. Destaques de uma obra que tem mais de 70 livros, entre ficção e não ficção. Sir Arthur nos deixou hoje, aos 90 anos.

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Veremos em tudo quanto é canto: "o maior/melhor escritor de ficção-científica". Rótulo fácil e enganador. Esse negócio de "o maior", "o melhor" é coisa de simplificadores. Sir Arthur foi um dos grandes. Meu favorito continua sendo Philip K. Dick. O que não significa que era "o maior".
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Mas é impossível ignorar a obra de Sir Arthur. Para minha despedida, vou destacar só um pequeno detalhe.

Stanley Kubrick, que é para o cinema o que Beethoven é para a música, queria criar um divisor de águas quando resolveu fazer "2001". Até então, filmes de ficção-científica eram todos "B" (ou "C"..."Z"). Discos voadores e monstros intergaláticos eram a matéria prima de simpáticos engraçadinhos, como Ed Wood. Kubrick queria o conhecimento e a imaginação de Sir Arthur.

Sir Arthur sabia que "2001" poderia ser sua obra-prima. Não sei dizer - ninguém saberia - qual foi seu sentimento-motivação quando resolveu revisar e reescrever seu texto no set de filmagens. Gosto de pensar que foi a simples necessidade de ver (e tocar) tudo aquilo que, até então, estava só em sua imaginação.

Dois gênios, trabalhando em conjunto, criando o mesmo mundo e demonstrando-o em diferentes mídias. Torço para que, no mínimo, uma parte desta experiência esteja documentada no recém-lançado DVD especial de "2001". Para quem gosta de estudar *criatividade*, este evento é quase único em nossa história.

HAL, que ainda não nasceu, acaba de perder seu segundo pai. Em março de 2108 (ou 2099), quem sabe, ele estará organizando uma bela festa para Clarke e Kubrick. Não será só pós-IBM (como provoca seu nome), mas também pós-MS, pós-Apple... pós-todos que perderam a oportunidade de criar um computador mais humano. O computador que Sir Arthur imaginou.

Tibet - Support the Dalai Lama

Dear friends,

Tibetans have exploded onto the streets in frustration--call on China to respect human rights and enter dialogue with the Dalai Lama now:
After decades of repression under Chinese rule, the Tibetan people's frustrations have burst onto the streets in protests and riots. With the spotlight of the upcoming Olympic Games now on China, Tibetans are crying out to the world for change.

The Chinese government has said that the protesters who have not yet surrendered "will be punished". Its leaders are right now considering a crucial choice between escalating brutality or dialogue that could determine the future of Tibet, and China.

We can affect this historic choice--China does care about its international reputation. China's President Hu Jintao needs to hear that the 'Made in China' brand and the upcoming Olympics in Beijing can succeed only if he makes the right choice. But it will take an avalanche of global people power to get his attention--and we need it in the next 48 hours.

The Tibetan Nobel peace prize winner and spiritual leader, the Dalai Lama has called for restraint and dialogue: he needs the world's people to support him. Click below now to sign the petition--and tell absolutely everyone you can right away--our goal is 1 million voices united for Tibet:

http://www.avaaz.org/en/tibet_end_the_violence/9.php

China's economy is totally dependent on "Made in China" exports that we all buy, and the government is keen to make the Olympics in Beijing this summer a celebration of a new China, respected as a leading world power. China is also a very diverse country with a brutal past and has reason to be concerned about its stability -- some of Tibet's rioters killed innocent people. But President Hu must recognize that the greatest danger to Chinese stability and development comes from hardliners who advocate escalating repression, not from Tibetans who seek dialogue and reform.

We will deliver our petition directly to Chinese officials in London, New York, and Beijing, but it must be a massive number before we deliver the petition. Please forward this email to your address book with a note explaining to your friends why this is important, or use our tell-a-friend tool to email your address book--it will come up after you sign the petition.

The Tibetan people have suffered quietly for decades. It is finally their moment to speak--we must help them be heard.

With hope and respect,

Ricken, Iain, Graziela, Paul, Galit, Pascal, Milena, Ben and the whole Avaaz team

PS - It has been suggested that the Chinese government may block the Avaaz website as a result of this email, and thousands of Avaaz members in China will no longer be able to participate in our community. A poll of Avaaz members over the weekend showed that over 80% of us believed it was still important to act on Tibet despite this terrible potential loss to our community, if we thought we could make a difference. If we are blocked, Avaaz will help maintain the campaign for internet freedom for all Chinese people, so that our members in China can one day rejoin our community.

Here are some links with more information on the Tibetan protests and the Chinese response:

BBC News: UN Calls for Restraint in Tibet

Human Rights Watch: China Restrain from Violently Attacking Protesters

Associated Press: Tibet Unrest Sparks Global Reaction

New York Times: China Takes Steps to Thwart Reporting on Tibet Protests