27 outubro 2006

Construindo Muros

Lá pelos idos de 220 A.C. os chineses ergueram a Grande Muralha, um monumento com cerca de 3.000 Km de extensão. Medo de hunos, mongóis e de todo mundo que fosse diferente. Outros tempos, de um tipo de barbárie que a gente finge que só existia naqueles tempos.

Em 1961 racharam Berlim em duas, separando-as com um muro de 150 Km. O medo já era outro. Temia-se que a turma 'oriental' não suportasse as tentações 'ocidentais'. Era estranha, marcada por um conflito "frio" que a gente pensa que já virou história.

Mas eis que em 26/out/2006 o presidente dos EUA assina um decreto autorizando a construção de um muro de 700 milhas (1100 e tantos Km) na fronteira com o México. Medo daquela multidão de latinos que invade a terra do Tio Sam pra entregar pizzas, puzzas e roupas lavadas. Foi ontem.

E, de repente, dois mil e tantos anos de história se (con)fundem. Um muro une republicanos estadunidenses, as extintas dinastias chinesas e aquele extinto partido soviético. Um muro volta a simbolizar a divisão de dois mundos.

Mas agora não é mais uma questão de destros versus canhotos, consumistas de mercado versus consumistas de estado. O novo muro é mais objetivo - não tem meias palavras em suas guaritas. Vai ter sobretaxa na tequila que abastece as margaritas?

Vai ter rebelião de coiotes e imigrantes? Vai ter passeata em Governador Valadares? Veremos panelaços em Guadalajara? Estourarão bombas em El Paso? O que será daqueles criminosos estadunidenses que sempre viram o México como um plano "B"?

Será que todo mundo vai aceitar o enésimo descalabro bushiano com a mesma mansidão que aceitaram Iraque, Guantanamo, corte de impostos de ricos, US$4 trilhões na guerra, Kyoto etc etc ?

Há aquela vontade de pensar que tudo isso é o início do fim. Não do fim do mundo, mas da era em que a nação mais poderosa e idiota de todos os tempos imaginava ter a autorização de um deus qualquer para fazer qualquer coisa.

Mas dá também aquele medo de pensar que tudo isso é o início do fim. Afinal, a gente ainda não aprendeu a construir muros que nos protejam da estupidez daqueles que constroem muros.


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No Graffiti: Muros de Átomos e Muros de Bits


3 comentários:

Anônimo disse...

Mas vc tá parecendo colunista de revista. Muito bem "construído" o texto...

Ah, e eu ainda não sabia do muro do Bush... É sério? Que isso....

Paulo Vasconcellos disse...

Tks, tks.

E sim, infelizmente é sério.

Paulo Vasconcellos disse...

Ah, tô me esforçando pra ser colunista de uma revista sim.

Da ATCHIM (atchim-blog.blogspot.com), é claro.